terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

U.E, passado, presente e futuro,

Uma vez consumada em 1945 a derrota da Alemanha nazi de Adolfo Hitler e contabilizadas as pesadas consequências de uma guerra que durou seis longos anos e que foi indubitavelmente a pior de todos as guerras que alguma vez a humanidade conheceu, a Europa encontrava-se traumatizada pelas marcas indeléveis que eram visíveis materialmente em cada um dos países beligerantes, assim como nas suas sacrificadas populações. Se a rendição assinada pelos generais alemães, também era simultaneamente sinónimo de uma nova e desejada paz entre os referidos povos e nações, não se podia pura e simplesmente ignorar ou minimizar os horrores do prolongado e vergonhoso holocausto, que reduzira literalmente a cinzas, mais de seis milhões de pessoas. Paralelamente a essa injustificada e inqualificável carnificina, as tropas aliadas inglesas, americanas e canadianas, as tropas compostas por soldados europeus, os que abraçaram a causa da resistência e finalmente as sacrificadas populações europeias, também registaram nas sua fileiras, outros muitos milhões de mortos, de feridos e deixaram muitas crianças órfãs, com um futuro bem sombrio.
Era então imprescindível e urgente reconstruir todas as infra-estruturas industriais e sociais, reorganizar as sociedades civis e assegurar uma nova ordem pública, assim como reaprender a viver e conviver em paz. Face à própria natureza dessa guerra, que voltou a demonstrar quão perigoso e destruidor o Homem pode tornar-se numa luta desumana e cruel contra os seus semelhantes, com o único intuito de conseguir satisfazer as suas loucas ambições, os juizes do tribunal de Nurembergue, a quem coube a ingrata e difícil tarefa de julgar os 21 dignatários e chefes nazis capturados, número infelizmente não representativo dos muitos criminosos nazis, fizeram questão de acompanhar as suas sentenças, com uma histórica advertência destinada ao Homem europeu e consequentemente, ao mundo inteiro : “Temos necessariamente que saber perdoar o nosso inimigo de ontem, mas nunca, jamais, esquecer o que o mesmo foi capaz de fazer”. Pois, esquecer, seria uma forma de denegrir e insultar as muitas vítimas assim como a sua memória.
Passados uns anos, enquanto a Europa se encontrava empenhada na sua indispensável reconstrução e modernização, o francês Jean Monet, teve a ousadia e coragem de pensar que, para impedir que um dia, a malfadada História pudesse vir a repetir-se de uma forma tão ou mais dramática ainda, tornava-se imprescindível convidar os inimigos de ontem, a serem os parceiros para o amanhã, unindo forças e esforços para construir o princípio de uma comunidade que se queria justa, pacificadora, forte e próspera. Assim, depois de uma primeira aproximação entre a França do General de Gaulle e o chanceler alemão Konrad Adenauer, a proposta e respectivos convites de união foram dirigidos ao Luxemburgo, à Itália, à Bélgica e finalmente à Holanda. Com a França a encabeçar o movimento e o assentimento político dos seus cinco parceiros, nascia a então denominada Comunidade Económica Europeia (C.E.E). Ou seja a Europa dos seis, cuja sede administrativa foi estabelecida em Bruxelas, enquanto o seu parlamento se fixava em Estrasburgo, no Leste da França, junto à Alemanha, apenas separada da França pelo poderoso rio Reno. Os primeiros passos foram marcados por várias controvérsias e dificuldades aliás facilmente compreensíveis, mas não suficientemente fortes para impedir a continuação do sonho de Jean Monet e o alargamento de uma comunidade inicial de seis países, para doze, adaptando um novo nome, o de União Europeia (U.E).
Com o passar do tempo, sucederam-se os Presidentes da Comissão Europeia, seus comissários e seus respectivos deputados, ao nível das instituições, enquanto também mudavam Reis, Presidentes e Primeiros ministros, entre outras figuras importantes dos países membros.
Hoje, realizado ou mesmo ultrapassado o sonho inicial, essa mesma U.E reagrupa um total de vinte e sete países e continua-se a dialogar e negociar a admissão de futuros países, embora com a introdução de novas modalidades, tal como a de parceiro privilegiado, no lugar de país membro efectivo.
Enquanto mudam, sucedendo-se, os principais protagonistas desse grande “clube”, na própria visão da U.E também se vão registando alterações sensíveis sobre a ideia e desejo de cada um, relativamente a um novo e futuro alargamento do referido “clube”. Uma coisa é certa, para poder continuar justificadamente a ser, por um lado, uma verdadeira União de ideias e ideais, de interesses recíprocos, tão políticos, como económicos e sociais e, por outro lado, permanecer geograficamente europeia nas suas fronteiras terrestres, parece evidente que esse hipotético e/ou provável alargamento, deverá obrigatoriamente ter em conta os seus próprios limites finais. Caso contrário, mudará por completo, tanto o seu sentido inicial, como a sua actual e futura razão de ser. Na sua composição actual, com os seus vinte e sete membros, já estão patentes as sérias dificuldades quanto à obtenção de um consenso maioritário, quanto mais por unanimidade para questões importantes, ou vitais. O melhor exemplo, encontra-se na muito falada constituição europeia, recusada então pela França e pelos Países Baixos, antes do último alargamento (com os dez novos membros) e que, após a sua posterior “transformação” em Tratado de Lisboa, a sua indispensável ratificação ainda não é uma realidade concreta. Aliás, muito além desses evidentes e inquestionáveis problemas internos, inerentes à sua organização, existem cada vez mais dúvidas quanto ao bom fundamento de querer continuar a juntar, aos actuais quatrocentos milhões de cidadãos europeus, não contando com os numerosos emigrantes legais e ilegais, mais alguns milhões de pessoas, originárias de países cujas histórias, culturas, costumes, religiões e situação geográfica, são inegavelmente diferentes e talvez mesmo antagónicos, comparativamente aos dos já numerosos e actuais países membros. Quem pode hoje garantir, que o prosseguimento dessa política de alargamento (sem limites) não seria sinónimo de riscos agravados para o nosso amanhã colectivo ? Em tudo na vida, é fundamental salvaguardar o conjunto de elementos que, reunidos, constituem e asseguram no tempo, um equilíbrio vital e imprescindível, para continuarmos em sintonia, na procura de um real e duradoiro progresso económico e social, em segurança entre os povos e, ainda mais importante, em paz connosco e com os outros.
Antes de se pensar seriamente num eventual alargamento, importa mais do que nunca, assegurar uma autêntica governabilidade da actual U.E, tendo em atenção a necessária serenidade dos povos, actualmente posta em causa com uma actual e já por si só alargada diversidade. Não existe de facto, uma verdadeira harmonização dentro desta actual União, nem na dos primeiros seis, quanto mais nos seus efectivos vinte e sete. No que diz respeito à adesão da Turquia, cujas controversas e intermináveis negociações estão em curso há muito, talvez possamos perguntar: que misteriosos trunfos terão afinal os americanos, para “obrigar” a Europa a admitir a Turquia como membro efectivo ? A quem compete decidir essa e outras tão importantes questões? Será a alguns milhares de privilegiados, homens e mulheres, ditos políticos, que vão e vêm sem parar, conforme resultados eleitorais nacionais, que deverão decidir, ou então competirá verdadeiramente essa escolha às populações que ficam no lugar uma vida inteira ?
No meio de tudo isso, já que os senhores e donos da política tanto falam à boca cheia de Democracia, com que direito e legitimidade, política e democrática, podem eles substituir-se aos seus eleitores, cidadãos contribuintes, recusando simultaneamente dar-lhes a palavra e o voto para poderem decidir democraticamente o seu futuro, o dos seus filhos e dos seus netos ? Já que o povo financia integralmente tudo e mais alguma coisa, inclusive o sustento dos numerosos políticos, é justo e coerente, dar-lhe os elementos susceptíveis de o ajudar a pronunciar-se sobre todos os dados importantes que sistematicamente influenciam positiva ou negativamente o seu quotidiano. Não se pode e não se deve querer falar mais alto que o próprio povo. Quem falou em soberania popular ?
Numa altura onde assistimos ao encerramento diário de dezenas de fábricas nos mais importantes países da U.E, que tem por implicações imediatas: o aumento do desemprego, já superior a duas dezenas de milhões de pessoas, o inevitável aumento de encargos com os respectivos subsídios e a diminuição drástica ou perda efectiva do poder de compra destes ex-empregados, importa concentrar todas as atenções sobre a imprescindibilidade de manter as populações europeias ocupadas, serenas, seguras e coesas e para isso acontecer, importa urgentemente encontrar formas sólidas e concretas de contrariar eficazmente, as diversas consequências agravadas da recente globalização em geral e do imparável crescimento da China e Índia, em particular. Custa afinal verificar, que nem a Europa nem o mundo ocidental estavam de facto eficazmente preparados para suportar tantas mudanças num prazo de tempo tão curto.
O preço a pagar a médio e longo prazo por esses sucessivos e gravíssimos erros, poderá ser tão caro para o mundo ocidental, U.E incluída, que poderá eventualmente significar uma forte e incontrolável destabilização de ordem socio-económica, com consequências hoje totalmente imprevisíveis para os países europeus, entre outros, assim como para suas respectivas populações.
Antes que tal assustador cenário venha a acontecer, é vital e urgente, tomarmos consciência dessa eventualidade, antes que a mesma se transforme inexoravelmente numa inexpugnável e fatal realidade.
Como é possível e admissível que quem nos governa, sem nunca terem sidos capazes até a data, de pacificar o mundo, eliminar a fome e a pobreza que afecta centenas de milhões de seres humanos, erradicar o analfabetismo que só serve os ricos e poderosos e conter eficazmente todas as formas de terrorismo em geral e a criminalidade em particular, persista incoerente e perigosamente em querer encaminhar o mundo para destinos tão imprevisíveis como arriscados ?
Será que a mais do que escandalosa e totalmente desmedida acumulação de riquezas de alguns, justifica colocar no altar dos sacrifícios, com toda a impunidade, alguns biliões de cidadãos anónimos, só e tão só, para ricos e poderosos atingirem de uma forma vincadamente egoísta, objectivos meramente pessoais.
O dinheiro, esse mal necessário e cada vez mais, pior repartido, terá comprovadamente as suas razões que a própria razão desconhece, para a infelicidade de uma esmagadora maioria de cidadãos do mundo.

Oxalá, que em conjunto, a inteligência, a razão, a cultura, a sabedoria, e a experiência humana, lenta e progressivamente conquistadas a custo de inúmeros sacrifícios ao longo de tanto e tantos séculos da História colectiva da humanidade, venham sobrepor-se definitivamente aos múltiplos e escabrosos riscos que escondem fatalmente todas as fraquezas individuais dessa mesma humanidade.
O Homem é capaz de fazer muito melhor do que tem feito até agora, se considerarmos que o Homem, na sua generalidade, tem plena consciência da absoluta necessidade de melhorar substancialmente, tanto a sua própria pessoa como a sua frágil e actual pouco invejável condição.
O seu futuro e a sua sobrevivência estão realmente em causa.
Por ninguém ter legitimidade para duvidar disso, compete-lhe (ao Homem) e em exclusivo, ter isso permanentemente presente na sua consciência, saber conceber e arquitectar os planos capazes de o fazer alcançar uma sobrevivência feliz, exigindo impiedosamente dele mesmo, todos os meios igualmente capazes de o ajudar a conquistar, no tempo, os objectivos corajosamente fixados.
Já não há muito por onde escolher e cada dia que passa, é seguramente uma vitória para a adversidade.


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