quarta-feira, 5 de março de 2008

Mais um negro aniversário,

No dia 4 de Março de 2008, completaram-se sete longos anos (aproximadamente 2.558 dias), sobre a inexplicável tragédia de Entre-os-Rios.
Logo pela manhã daquele dia, os meios de comunicação social anunciaram que, a “Associação das vítimas da queda da ponte Hintze Ribeiro” em Castelo de Paiva, deu a conhecer a sua inesperada decisão de desistir oficialmente do pedido de indemnização, elaborado a pensar nos familiares das vítimas, desistência essa, motivada pela sua perda de credibilidade no sistema judiciário.
Essa atitude, além de exemplar e muito corajosa, vem de uma certa forma demonstrar à sociedade civil e respectivo Estado, que, não contente de sofrer em silêncio, o povo também sabe sofrer com grande dignidade.

Do ponto de vista moral, essa tomada de posição também representa, inequivocamente, uma forte e enérgica “bofetada” psicológica destinada a todo o aparato político, judicial, policial e administrativo que, juntos, representam o Estado Português e que, em mais um caso, se mostrou total e incompreensivelmente incapaz, ao longo de tantos anos, de encontrar os culpados pela queda da referida ponte e levá-los a Justiça para aí serem publicamente sentenciados.
De facto, todos sabemos da já lendária lentidão dessa Justiça, que muitas das vezes, por demoras excessivas, entre outros aspectos pouco abonatórios, não chega até ao povo, apesar dessa mesma Justiça ser um dos poucos direitos que a constituição portugueses garante ao cidadão.

No caso presente e considerando que, apesar das diversas e exaustivas investigações levadas a cabo, nenhum culpado foi encontrado até a data, tal significa muito provavelmente que tal insólita situação permanecerá inalterada no tempo ! Afinal e até prova em contrário, a culpa morreu mesmo solteira !!! Apesar de, na altura da sua demissão, o então ministro das obras públicas, Jorge Coelho, ter afirmado peremptoriamente o contrário !!
Essa inadmissível atitude dos poderes públicos, comprovadamente dotados de meios suficientes para que se faça Justiça num caso como este, deixa pressupor que existem indícios de que os possíveis e eventuais culpados beneficiaram de uma determinada protecção, orquestrada por quem possui os meios legais para que tal aconteça.

Quem vive neste país e se orgulha de estar minimamente atento ao que se passa, nomeadamente ao nível das altas esferas do poder, adquire naturalmente a plena consciência de que existem fortíssimas suspeitas da existência de um clima generalizado de total impunidade, sempre que se trata de “pessoas importantes”, cujo nomes aparecem, directa ou indirectamente ligados a situações ditas tendenciosas, que nunca chegam a ser levadas até ao fim.
Como disse, aliás e muito bem o recém empossado Bastonário da Ordem dos Advogados: “Nem valerá a pena citar nomes que toda a gente conhece”.
Resumindo essa bem triste história, no que diz respeito ao acidente em si, existe um inquestionável certeza : a dramática e prematura morte violenta de 59 (cinquenta e nove) pessoas, entre as quais, crianças e adultos, agravada com o não menos dramático sofrimento de todos os familiares e amigos destas inocentes vítimas. No que diz respeito aos tribunais, estamos na presença de uma outra certeza, bem mais inaceitável e inequivocamente vergonhosa, na medida em que não quiseram ou não souberam dar a única resposta que tamanha tragédia merecia e justificava: Verdade e Justiça !
Sendo assim, seja por incapacidade, por desleixo, ou seja ainda por conveniência, o que neste caso terá obrigado a operar um compreensível encobrimento da verdade, o Estado e a sua poderosa e onerosa máquina, não permitiram que os familiares das 59 (cinquenta e nove) vítimas, fizessem um verdadeiro e legítimo luto dos seus entes queridos.

Já circulam por aí rumores que, se tivesse havido e falecido, no meio destas 59 (cinquenta e nove) vítimas, uma importante personalidade, tal como um ministro ou outro qualquer dignitário da nação, os responsáveis pela tragédia teriam sido atempadamente descobertos, apanhados, inculpados, julgados e exemplarmente sentenciados.

Seja como for, num incondicional apoio especialmente dirigido a estes pobres familiares e amigos das vítimas, muitos outros portugueses, anónimos e honrados, devem compreensivelmente sentir-se solidariamente abandonados, insultados, usurpados e injustiçados, perante tão indigna e revoltante actuação, vinda de uma entidade eticamente obrigada a ter uma atitude literalmente oposta, ou seja, proteger os seus cidadãos, até as últimas consequências.
Agindo desta lamentável forma, o Estado e seus responsáveis, correm o risco de serem novamente acusados de arrogância, prepotência e incúria, todas perfeitamente inadmissíveis, por se tratar de defender sorrateiramente interesses não declarados, o que neste caso, equivale a matar pela segunda vez, cada uma das 59 (cinquenta e nove) vítimas dessa tragédia, envergonhando profundamente o país e suas instituições.
De entre todas as funções que são do domínio exclusivo dos poderes públicos e cujas finalidades e orientações devem sempre e necessariamente fazer prevalecer os verdadeiros fundamentos de um Estado de direito, dos valores intrínsecos da Democracia e dos inalienáveis direitos do cidadão, o ministério da Justiça, respectivos tribunais e seus magistrados, são, sem margem para dúvida, os que possuem a obrigação ética e deontológica de trabalhar e decidir no maior respeito pelos mais elevados padrões de equidade, honradez e rectidão.

Além do incondicional respeito pelo próprio principio da honradez, imprescindível a qualquer magistrado encarregado de fazer Justiça com sentido de nobreza e de dignidade, também é imprescindível salvaguardar a honradez do próprio Estado, a bem do país e a bem de todos, sob pena de deixar instalar e alastrar perigosamente um sentimento generalizada de total e absoluta descrença, no país e nas suas instituições.

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